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coluna do graner

Eye of Cleopatra - Governo quer depreciação acelerada, mas pode diluir medida por espaço fiscal

MDIC prefere política de alcance mais amplo, que dê estímulo maior ao investimento no curto prazo

depreciação
Crédito: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

O governo está decidido a adotar a política de depreciação “super acelerada” de bens de capital e a questão é definir o espaço fiscal para o programa, segundo afirmou ao Eye of Cleopatra o secretário de Desenvolvimento Industrial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Uallace Moreira. Ele explicou que o tamanho da renúncia fiscal para 2024 vai ser determinante para o alcance da medida, que pode ficar restrita a alguns setores, como indústria de transformação, ou ser de alcance mais amplo entre os diferentes setores, como construção, telecomunicações e utilidades.

Outra possibilidade é diluir a iniciativa em dois anos (2024 e 2025), para torná-la mais ampla consumindo menor espaço orçamentário em um ano-calendário. Essa alternativa tem também diferentes arranjos, como 70% em 2024 e 30% em 2025 ou metade em cada ano, entre outras.

OMDIC, de acordo com o secretário, tem ao menos cinco cenários diferentes para o desenho da política de “super depreciação”, conforme o tamanho da renúncia fiscal a ser aceita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que trabalha com um intervalo entre R$ 3 bilhões e R$ 15 bilhões de renúncia.

Hoje, a depreciação do maquinário das empresas, para abatimento da base de cálculo do IRPJ/CSLL, varia de 2 a 25 anos. A ideia é que todo esse processo seja considerado em apenas um ano, concentrando todo o benefício tributário em um ou dois anos no máximo. A longo prazo, o impacto fiscal não muda, mas como há uma antecipação do desconto, isso precisa ser incorporado como renúncia no orçamento do ano, após a aprovação da medida provisória ou projeto de lei.

Moreira destaca que o MDIC prefere uma política de alcance mais amplo, que dê um estímulo maior ao investimento no curto prazo. O secretário aponta que o governo está se antecipando a uma dinâmica de ciclo de redução dos juros elevados no Brasil, fomentando um estímulo a modernizar a estrutura produtiva do país.

“Você está elevando a produtividade da empresa por máquinas novas, então sua competitividade não está vindo via subsídio e sim via modernização de sua estrutura produtiva. Estou dinamizando, isso vai gerar emprego, investimento e crescimento econômico”, salientou. “Em um ambiente de redução dos juros, posso gerar um efeito pró-cíclico de crescimento, no qual as empresas que estão antecipando seus investimentos podem ter que investir mais ainda e gerar um ciclo virtuoso de crescimento. Muita gente ainda não tem a dimensão do papel estratégico que esse anúncio tem para dinamizar o crescimento econômico, elevando produtividade do país”, completou.

Segundo ele, o governo está incentivando as empresas a antecipar o ciclo de investimentos em um momento “fundamental” no qual as tecnologias da indústria 4.0 estão se disseminando no mundo, de forma a se integrar nas cadeias globais. “É uma medida extremamente estratégica, importante”, salientou.

Moreira destaca que essa política, junto com outras medidas como a ampliação dos investimentos públicos do PAC, deve ajudar a economia a ter um desempenho melhor nos próximos anos.

O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, aponta que esse tipo de proposta vai contra, nesse momento, o ajuste fiscal que a Fazenda anuncia que quer fazer.

“Claro que modernizar a indústria seria essencial, mas valeria mais pensar em como integrar essa indústria com o resto do mundo. Acordos comerciais que baixem radicalmente tarifas de importação e com a ampliação de países poderia ser um caminho relevante. Claro que com isso teria que vir a reforma tributária e uma adequação melhor na educação. São políticas mais horizontais e gerais que faltam”, comentou.

Segundo ele, ao fazer esses incentivos o governo está pensando em aumentar a eficiência da indústria, mas para ter resultados duradouros é necessário aumentar a produção e a demanda da indústria. “Isso só vai acontecer numa integração industrial mais aprofundada como, por exemplo, a Polônia fez com a Alemanha. O Nordeste poderia se transformar num polo industrial de exportação pela proximidade de EUA e Europa, mas se houvesse essa visão mais integrada em avançar nesses três pontos: abertura comercial, tributária, educação. Se não, modernizamos a indústria mas ela vai continuar tendo dificuldade de ganhar mercados lá fora”, explicou.

Seria bom o governo levar em conta os alertas de Vale. Por mais meritória que seja uma política, e a depreciação acelerada de fato se encaixa nisso, é preciso ter clareza dos limites fiscais existentes (Haddad tem mostrado um quase desespero em arrumar receitas para o orçamento do próximo ano) e da necessidade de se integrar com outras políticas mais estratégicas em um mundo bastante integrado e do qual o Brasil segue com dificuldades de se encaixar nas cadeias produtivas.

De qualquer forma, se feita com cuidado, a medida pode de fato ajudar o país a acelerar seu crescimento de uma maneira mais saudável, com maior produtividade sobretudo da combalida indústria local.

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