
O Senado Federal aprovou no início da noite desta quarta-feira (21/6) a indicação do advogado Cristiano Zanin ao Supremo Tribunal Federal (STF) por 58 votos favoráveis e 18 contrários, sem abstenções. Mais cedo, Zanin teve sua indicação aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) após quase oito horas de sabatina. O indicado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve 21 votos favoráveis e cinco contrários dentre os 26 senadores titulares presentes no colegiado.
Formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o advogado de 47 anos tem histórico de atuação com foco especialmente em empresarial e falimentar. Zanin ficou conhecido nacionalmente por ter feito a defesa de Lula nos processos da Operação Lava Jato. Se aprovado, vai ocupar a vaga aberta em abril com a aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski.
Ao longo da sabatina, o advogado foi questionado sobre sua carreira, sua amizade com o presidente Lula e suas posições em relação a temas como combate ao uso de drogas, aborto e casamento entre pessoas do mesmo sexo. Aos senadores, ele disse que entende que não cabe ao STF legislar. “Esse papel é do Congresso Nacional”, afirmou.
A indicação de Zanin vinha sendo criticada por conta de sua proximidade com o presidente Lula – senadores de oposição argumentam que fere o princípio da impessoalidade. Zanin, no entanto, ressaltou que nos casos em que atuou como advogado, não poderá julgar no Supremo
Em sua fala inicial, Zanin comentou os rótulos que recebeu de “advogado pessoal”, “advogado de luxo” e “advogado de ofício” e disse que sempre procurou desempenhar sua função “com maestria, acreditando no que é mais caro para qualquer profissional do Direito: a justiça”. “Penso que a imparcialidade do julgador é elemento estruturante da própria Justiça. Todas as medidas que eu possa adotar para assegurar a credibilidade do sistema de justiça, eu adotarei”, assegurou.
O advogado se comprometeu, caso aprovado, a seguir respeitando as instituições democráticas e a Constituição. “Eu não vou mudar de lado, pois meu lado sempre foi o mesmo, o lado da constituição, o das garantias, o do amplo direito de defesa do devido processo legal. Para mim, só existe um lado, o outro é barbárie, é abuso de poder”, completou.
Embates
Um dos momentos mais esperados foi o reencontro de Zanin com o ex-juiz Sergio Moro. Ao longo de 14 minutos, o senador apresentou uma lista de perguntas ao advogado, mas garantiu que “não existe nenhuma questão pessoal”. Ele pediu a Zanin detalhamento sobre a relação dele e de seus parentes com Lula, o questionou sobre contratos com empresas investigadas na Lava Jato, se ele se afastaria do julgamento de todos os processos que envolvem a operação.
Zanin respondeu que teve uma convivência bastante frequente com o presidente Lula enquanto era seu advogado e que preza essa relação – ele ainda desmentiu que tenha sido padrinho de casamento de Lula. “A minha relação tem esses contornos, eu jamais vou negá-la, ao contrário, como já disse na minha apresentação, sou grato ao presidente Lula por ter indicado meu nome ao STF.”
O nomeado também respondeu que, se for aprovado como ministro do STF, vai avaliar seu impedimento para julgar casos ligados à Operação Lava Jato a depender do conteúdo e das partes envolvidas. “Eu não acredito que o simples fato de colocar uma etiqueta no processo, indicar o nome Lava Jato, possa ser um critério a ser utilizado do ponto de vista jurídico para aquilatar a suspeição e o impedimento”.
A maioria do eleitorado (55%) desaprova a indicação de Zanin ao STF, como mostra pesquisa da Genial/Quaest divulgada nesta quarta-feira. Somente 22% dos entrevistados apoiam sua nomeação, um índice praticamente igual ao daqueles que afirmaram não saber ou que não responderam (21%). Para 59% do eleitorado, o presidente não deveria ter o poder de indicar quem quisesse para o posto de ministro do STF.
Veja o que Zanin falou sobre:
Amizade com Lula
“Na condição de advogado, tive uma convivência bastante frequente. Não fui padrinho do casamento do presidente Lula. E prezo muito essa relação, assim como a relação que tenho com outras pessoas, inclusive deste Senado. (…) A minha relação tem esses contornos, eu jamais vou negá-la, ao contrário, como já disse na minha apresentação, sou grato ao presidente Lula por ter indicado meu nome ao STF.”
Postura garantista
“Eu não vou mudar de lado, pois meu lado sempre foi o mesmo, o lado da constituição, o das garantias, o do amplo direito de defesa do devido processo legal. Para mim, só existe um lado, o outro é barbárie, é abuso de poder. Com muita honra e humildade, sinto-me seguro e com a experiência necessária para, uma vez aprovado por essa casa, julgar temas relevantes e de extremo impacto na sociedade”, disse.
União homoafetiva
“Defendo todas as formas e expressões do amor, de as pessoas poderem expressar o afeto e o amor de sua forma. Isso tem que ser respeitado pela sociedade e pelas instituições”, disse Zanin. “Temos hoje já uma resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que viabiliza e dá eficácia a essa interpretação e temos o julgamento já realizado pelo STF”, concluiu.
Aborto
“O direito à vida está expressamente previsto no artigo 5º do caput da Constituição Federal. É uma garantia fundamental, nessa perspectiva, temos que enaltecer o direito à vida, porque aí estamos cumprindo o que diz a Constituição da República. Também nesse assunto, existe um arcabouço normativo consolidado na tutela do direito à vida, como também nas hipóteses de exclusão de licitude, como, por exemplo, na hipótese de interrupção da gravidez como prevê o artigo 128 do Código Penal.”
Combate ao uso de drogas
“Não é uma questão de ser favorável ou não ao combate às drogas. Eu acho que a minha visão, efetivamente, é a de que a droga é um mal que precisa ser combatido. E, por isso, este Senado tem, inclusive, aprimorado a legislação com este objetivo, acredito, de promover o combate às drogas e os temas que estão relacionados. Então, a única observação que eu faço é a de que, dentro de um Estado de direito, os agentes públicos precisam ter as suas atribuições definidas em lei, sobretudo quando realizam atos de persecução. O Estado não pode adotar a regra do vale-tudo. O Estado tem um poder enorme e esse poder deve ser contido sempre que usado fora daquilo que prevê a lei ou usado com abuso.”
“Advogado de luxo”
“Alguns me rotulam como ‘advogado pessoal’, porque lutei pelos direitos individuais mesmo contra a maré, sempre respeitando as leis brasileiras e a Constituição. Também há quem me classifique como ‘advogado de luxo’ porque defendi, estritamente com base nas leis brasileiras, causas empresariais de agentes institucionais importantes para a economia e que empregam milhares de pessoas. E ainda me chamam de ‘advogado de ofício’, como se fosse um demérito injustificável. De novo: respondo sempre que sempre procurei desempenhar minha função com maestria, acreditando no que é mais caro para qualquer profissional do Direito: a justiça.”
Combate à corrupção
“Penso que o combate à corrupção é fundamental para a sociedade. Ele deve acontecer, agora, sempre com a observância do devido processo legal. O que não se pode fazer – aí pode se configurar o lawfare – é usar o combate à corrupção como pretexto para perseguir pessoas, empresas e instituições. Então, você cria acusações sem materialidade e promove, simultaneamente, uma campanha contra o alvo, para buscar alcançar fins ilegítimos. Isso é o lawfare e isso acredito que não podemos aceitar.”